Viagem inquietante e reveladora

Márcio ABC
Agência BOM DIA - SP, 18/06/2010

Quando Leonardo Brasiliense conquistou, em 2007, o Prêmio Jabuti com seu livro juvenil “Adeus Conto de Fadas”, ele já tinha várias obras publicadas, todas elas feitas no capricho, todas elas muito diretas, uma flechada no coração do leitor.

“Três Dúvidas” é assim também. Li o livro numa única estocada. E com o coração na mão. Porque, além da profundidade da proposta filosófica (a sinopse da Companhia das Letras começa assim: “Três dúvidas”
é um livro sobre a dificuldade de se conhecer a realidade.
Será que o que eu penso existe mesmo?), há ali uma tensão permanente, um fio esticado que está sempre nos ameaçando com um possível rompimento.

Acho que, antes de mais nada, antes da própria
“proposta maior” da obra, vem essa tensão, essa desesperadora perspectiva de irresolução, essa inquietante
sensação de que, ao entrar no livro, fazemos parte de
um voo cego cujo destino se abre à nossa frente como
um insuportável leque de incertezas: não sabemos mais se teremos uma pista segura para aterrissar na volta.

O autor é médico, mas suas incursões na ficção –
neste livro, em três situações distintas – revelam uma extraordinária capacidade de percorrer muito à vontade os cenários criados por ele. É como se ele conhecesse como
a palma da mão, por exemplo, a profissão de jornalista, um dos centros nervosos da terceira novela da obra. Assim como surge sua capacidade de desvendar a alma do sujeito aposentado da primeira novela ou o pavor do jovem interiorano que se vê terrivelmente ameaçado num grande centro urbano.

O novo livro de Leonardo Brasiliense, ao contrário de muitas novidades que enchem as prateleiras das livrarias com palavras que se esvaziam ao primeiro olhar, é uma obra que lateja. Suas palavras inquietam e provocam. Proporcionam ao leitor uma aventura íntima, mas que, a despeito de sua individualidade, abraça um âmbito generosamente coletivo: nossas almas cheias de desejos incertos.